O recuo das águas do Guaíba no centro histórico de Porto Alegre começou a mostrar a dimensão do estrago causado pela enchente histórica que atingiu a capital há duas semanas. Ainda sem energia elétrica, o trabalho dos últimos dias na região mais antiga da cidade tem sido a limpeza urbana e a limpeza dos próprios estabelecimentos.
"Do jeito que está, vou levar a semana toda para poder organizar, limpar e montar a loja novamente", prevê Vespasiano de Menezes Neto, gerente de uma farmácia nas proximidades do Mercado Público da capital, este ainda alagado e fechado. Na tarde dessa segunda-feira (20), Neto liderava um grupo de funcionários em uma pesada limpeza do estabelecimento, ainda impregnado por lama fétida. Pelo chão, caixas de medicamentos e produtos de higiene. Ali, conta o gerente, a água chegou a cerca de 1,5 metro de altura. Ele chegou a tentar subir as prateleiras, mas a inundação inutilizou 70% das mercadorias, além de equipamentos de informática e mobiliário. "Medicamentos são produtos com alto valor agregado. Calculamos prejuízos de R$ 200 a R$ 250 mil apenas com produtos", diz Neto.
A poucos metros dali, na parte de trás da Praça 15 de Novembro, o bazar de artigos populares da chinesa Li Hong Shia estava no quarto dia de limpeza, com muito a ser feito. Um dos funcionários da loja, Edson Nunes, diz que houve poucas horas para se preparar antes da subida das águas do Guaíba. "Não imaginamos que subiria tanto e só elevamos uma prateleira de produtos. Quando voltamos, tivemos que jogar grande parte dos produtos fora, não deu nem pra lavar, com essa água toda contaminada", relata. A previsão de Nunes é de que a loja só consiga reabrir ao público em cerca de 10 dias.
Abalados com a extensão dos danos ao comércio, lojistas ouvidos pela Agência Brasil esperam mais apoio do poder público no processo de reerguer os negócios.
"Perdi geladeira, impressora, centenas de mercadorias na lama. O imposto tem que baixar, para pagar funcionário", cobra Li Hong Shia, dona de um bazar na Praça 15 de Novembro.
Proprietário de uma ótica na Avenida Otávio Rocha, Paulo Roberto não vê alternativa de recuperar o negócio se não houver apoio direto dos governos.
"A gente depende dele [poder público]. Se não der apoio, ferrou. Tira imposto, qualquer coisa assim. Não tenho nem ideia, tchê, do prejuízo que tive. A gente está começando a limpar, botei metade da loja na rua, depois a gente vai saber como ficou a coisa".
"Se todo mundo tivesse feito a sua parte, isso não teria acontecido. Ninguém acreditava nessa imensidão de água, mas eles [poder público] tinham essa informação bem antes disso", reclama Vespasiano. "O IPTU dessa loja é R$ 15 mil por ano. Essa loja tem 25 anos, calcula aí o quanto contribuímos", acrescenta, defendendo que haja perdão ou renegociação dos débitos.
Entre as medidas anunciadas até agora em favor dos comerciantes gaúchos afetados, o governo federal prorrogou os prazos de vencimento dos tributos federais e das parcelas dos parcelamentos para contribuintes dos municípios em estado de calamidade pública.
O Comitê Gestor do Simples Nacional também estendeu os prazos de vencimento dos tributos apurados no Simples Nacional. Já a Procuradoria Geral da Fazenda Nacional (PGFN) adiou os prazos de vencimento das parcelas dos programas de negociação e suspendeu por 90 dias prazos relacionados a atos de cobrança da dívida ativa da União.
No plano estadual, a Secretaria da Fazenda (Sefaz) flexibilizou o pagamento de tributos. Já a prefeitura de Porto Alegre prorrogou os vencimentos de tributos como ISS, IPTU e TCL. Além disso, estão suspensas ações de negativação e protesto, cobranças administrativas e procedimentos de exclusão de contribuintes de negociações por inadimplência de parcelas.
O Sindicato dos Lojistas do Comércio de Porto Alegre, que representa 20 mil empresas na capital, lançou uma campanha na internet para aproximar consumidores e lojistas e tentar fortalecer os pequenos negócios.
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